terça-feira, 18 de junho de 2013

A economia das trocas linguísticas - Pierre Bourdieu


Não basta falar, é preciso estar autorizado a falar. Não é a ordem dada que faz sua execução, mas sim quem dá esta ordem. Um soldado ordenar a seu tenente que “limpe as latrinas”, consegue na melhor das hipóteses, comprovar que é isso normalmente chamado de louco. Dai que os discursos por si só não bastam, há todo um entorno que importa. Não basta ordenar que a latrina seja limpa, e preciso poder dizer isso. Porém este jogo se dá de forma menos rígida, sem uma hierarquia clara e já formada.
Talvez, um exemplo mais claro seja o da pessoa que por usar palavras difíceis e termos técnicos ganha maior legitimidade de fala do que outro falante teria. Não só há esta economia das palavras, onde escolher em que momento e quais palavras usar se constitui algo muitas vezes mais considerado do que o próprio discurso, como influi também toda uma série de investimentos linguísticos localizados fora do universo das palavras.
Não raro observações a respeito dos hábitos e costumes de uma pessoa influem sobre seu discurso, “não sabe se comportar” ou “se porta mal” implicam também no valor e abordagem dada a tal fala – e falante. Um exemplo típico que encontramos nas discussões “de internet”, são os deboches feitos ao adversário de debate quando comete erros gramaticais. Os políticos sabem disso muito bem, não é tanto o dito, por isso “caras bonitas” fazem mais sucesso. Não por acaso esta atenção tão grande dada as roupas da Dilma, que enquanto mulher e presidenta precisa aparecer como tal (e aqui vale plantar a semente da discórdia e perguntar no que a forma de se vestir influi na qualidade do serviço de alguém?), como se sua primeira obrigação fosse suprir muito mais um conceito de feminilidade do que de governabilidade.
A forma como se fala (calmo, enérgico, pausadamente, etc), passando pela postura do corpo (coluna ereta, porte físico, etc), indumentária, posição social (professor, juiz, engenheiro, família tradicional, etc) e as palavras ditas (você e não ocê, por exemplo), acabam surtindo um efeito maior do que o dito. Vide várias críticas a pessoas que utilizam outras palavras para dizer as mesmas coisas, característica usualmente dada às classes mais desfavorecidas financeiramente. Vemos ainda algo semelhante a questão dos bárbaros, palavra que originalmente designa quem não sabe falar direito minha língua, que gagueja, logo é outra cultura ou parte de outro lugar, e essa dissemelhança me permite posicionar tal falante gago em um estrato social diferenciado, justificando assim algo injustificável, tratar de forma distinta uma pessoa pelo entorno que o construiu, e não seu posicionamento ético no convívio social. E com isso buscar justificar se tá sujeito merece ou não ser ouvido.
A linguagem está imbuída de poder simbólico e para ser validada precisa deste capital cultural.

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