segunda-feira, 16 de julho de 2012

O livro das ignorãças - Manoel de Barros


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Sou um péssimo leitor de poesia, mas há algo em Manoel de Barros que me fascina. Creio que é sua proximidade com a natureza, não por acaso o Pantanal aparece constantemente. Vi em alguma entrevista de que Manoel de Barros não tem grande amor pela cidade, mas sim pelo Pantanal. Sua experiência na cidade não fora grande coisa, ao menos parece. Mesmo tendo viajado para várias cidades importantes, metrópoles, seu ambiente parece estar na mata.
Seus poemas parecem aproximar uma lupa sobre este verde que fascina, mas esta lupa de Manoel não parece cair no pecado do cientista, pois esta aproximação não busca o estudo de um assunto restrito esperando como conclusão a exaustão. Talvez busca nesta sua aproximação um distanciamento, dai sua referência a infância. O mundo adulto dá vontade de fugir, mas não para a cidade onde ninguém nos acha, mas para infância, quando a visão não estava tão viciada.
Esta aproximação com a natureza, apesar de poder parecer demais idílica e paradisíaca, acaba refletindo algo tão próximo de nós que acabamos não nos dando conta. De alguma forma Barros está falando do Brasil, que apesar de Belo Monte e toda uma sede de largas fatias da sociedade em busca de uma reprodução tropical do que se entende por Europa, vivemos num lugar diverso, plural, que não cessa de se mover. Esta é a mata, que além de cercar nossas cidades (Blumenau, Rio de Janeiro), cerca boa parte de nosso viver. Talvez seja mais necessário se refugiar para as montanhas do que trancar-se em casa. Creio que o selvagem transite entre a metáfora e o literal.
Sua proximidade com a natureza pode fazer com que sua poesia seja muito interessante a biólogos e deleuzianos. Já que é uma aproximação que não busca em momento algum naturalizar algo, arrisco dizer até que o contrário.
Tal desconstrução de lugares tão comuns não ocorre apenas por meio dessa constante figura do pantanal, a língua também entra no samba. No próprio título do livro já está explícito o que se encontrará repetidas vezes ao longo do livro. Como o autor bem indicou, agramaticar é parte fundante de sua poesia. O poeta brinca com a língua, faz da língua sua, se apropria dela e dança com ela, fazendo com que ela ceda aos movimentos necessários. Tudo isso ocorre numa tal harmonia que por vezes é custoso perceber. Tal atitude me lembra o que crianças muitas vezes fazem sem grande esforço, e nós tão orgulhosos da vida adulta, rimos tratando algumas vezes com escárnio. Sua agramáticação está intimamente ligada a natureza constantemente descrita, já que sua poesia parece ser em grande medida rizomática. E coloco isto considerando o fato de Manoel de Barros não ter ideia de quem seja Gilles Deleuze.
Não bastasse, Manoel de Barros se mostra como uma figura interessante, filiado ao Partido Comunista Brasileiro em sua juventude, o abandonou assim que Prestes e Vargas realizaram a famosa aliança, e quando fora indicado a academia brasileira de letras, preferiu não. Este poeta do pantanal pode orgulhar-se de escrever poemas que grudaram um péssimo leitor de poesia ao livro.