O filme trata de contar os primeiros anos (o grupo existiu até 1998) do grupo alemão Rote Armee Fraktion, mais conhecido como grupo Baader-meinhof. O bacana do filme é que ele não esquece de trazer algumas questões que eram o assunto do dia na época, como a Alemanha repartida entre os principais países vencedores após a segunda guerra. Do lado ocidental temos uma Alemanha altamente influenciada pelos EUA, que já estavam no Vietnam – é deste lado do muro que surge o grupo. Não podemos esquecer também todo o clima de mudança que estava ocorrendo na época (espero que 1968 diga alguma coisa). Para quem não sabe a Alemanha tem uma série de questões desagradáveis, cito aqui a título de exemplo a questão educacional deles, onde os alunos passam por uma triagem aos 10 anos de idade que irá influenciar mais tarde se ele irá fazer uma faculdade ou um técnico, definindo em grande peso possibilidades financeiras, citando o assunto a grosso modo[1]. Havia ainda – e isto é de forma comum para o mundo ocidental – um sistema penitenciário muito duro, falo isto com foco nos reformatórios (já que muitos integrantes do grupo vinham daí). Bem, pesquisando um pouco e assistindo o filme[2] creio que ficará mais claro do que se eu tentar explicar.
Neste contexto organizações que apostam no meio armado como saída para fins políticos aparecem: Frente Popular de Libertação da Palestina, Exército Vermelho Japonês, Tupamaros, Montoneros, além da recente guerra da Argélia e os movimentos anti-coloniais e a revolução Cubana, dão um pano de fundo para o surgimento de Baader-meinhof na Alemanha (ocidental).
De forma geral a primeira coisa que se faz ao se falar de terrorismo, em especial quando se discute algum destes grupos inseridos num período de guerra fria, é escolher um lado e acusá-lo ou defende-lo até o fim, algo como: “Eles estavam certos”, “Eles estavam errados”. O filme não vai por este caminho, pois claramente mostra o autoritarismo de Andreas Baader, por exemplo, assim como as terríveis situações de autoritarismo do próprio governo. Aqui creio ser importante superar esta herança de guerra fria que temos em nós e propagamos muitas vezes, e proponho entender o assunto para além de bem contra o mal (ou se quiserem de direita contra esquerda). Nisto li uma entrevista do diretor do filme, onde ele prezava por um ponto importante, e faço coro a isto. A questão que me soa mais central, é pensar o que leva alguém a largar toda monotonia rítmica de sua vida mudando-a completamente para pegar em armas e/ou colocar bombas? Porque uma famosa jornalista vai abandonar sua carreira para se tornar uma guerrilheira urbana? Bem, aqui quero lembrar do Estado policial que se tornava a Alemanha no período. Não esqueçamos que a Alemanha formava a fronteira com a cortina de ferro, por isso estava próxima ao “inimigo”. Certamente sob este pretexto inúmeras medidas de exceção vinham se tornando regra. Isto acaba gerando desconfortos que levaram ao surgimento de vários grupos, com práticas variadas, entre eles o Baader-Meinhof. E aqui, apesar de soar algo muito diplomático, é importante dar espaço e autonomia para que as pessoas possam ter maior (acho complicada esta palavra) liberdade, e aqui não falo em restrito ao Estado, sempre apontado por todos os dedos, mas a própria preocupação que me ataca constantemente nos e-mails que recebo sobre a união civil gay, por exemplo. O que me interessa, qual importância tem para mim saber o que o outro faz na cama? Porque eu tenho que mandar e-mails dizendo como as pessoas devem ser?
Certamente, e aqui me firmo sobre um senso comum, tais práticas tomadas pelo grupo alemão foram condicionadas por um certo desespero. Assim como os grupos do terceiro mundo, que escolheram tal atitude como um meio de pedir atenção. Muitas vezes ela se mostrando como a resposta mais direta e imediata, apesar de nem sempre ser a mais eficiente, porém muitas vezes apontada como única forma[3].
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Considero interessante e válido se debruçar sobre esta vontade de futuro que se mostra firme desde a revolução francesa. Podemos observar, tanto num grupo ou n’outro uma vontade para o futuro, o planejamento de como deverá ser, como temos que ir construindo. Isto está claro em partidos políticos, igrejas, a grande maioria das ideologias (tanto da esquerda quanto da direita) e as teorias totalizantes. Não gosto deste desejo de criar um caminho, feito uma grande rodovia, por onde todos devem passar, frases como “o caminho do bem ou do mal, está comigo ou contra mim, ou eles ou nós”, me soam como vontades totalizantes. Este tipo de discurso já não consigo mais acreditar. Por isso entendo os movimentos extremamente focados que ocorrem hoje, a exemplo da luta contra homofobia, acabam se tornando mais eficientes do que toda uma teoria que vai abarcar o máximo de coisas, como se fosse o máximo de tijolos para construir uma estrada para a liberdade. E por isso digo que somos vítimas da guerra fria, pois acreditamos que a escolha de uma teoria totalizante, uma teoria que se propõem dar conta do todo, vai levar a generalizações e esta idéia de guerra na vida civil, ocasionando este “eles contra nós”, esta bipolaridade, que encontramos em tantas esferas. E deixo uma pergunta sobre esta bipolaridade, qual diferença havia entre uma fábrica da Alemanha Oriental em relação a Alemanha Ocidental? Nenhuma significante, isto é certo.
[1] Conheço pouco do assunto e ele mereceria no mínimo um post, sobre o sistema educacional se não me engano, esta divisão na Alemanha das escolas em três tipos datam do século XIX, apesar de todo um mote de discussões sobre o assunto e a autonomia de cada estado (o que poda a possibilidade de simples generalização), ainda assim este sistema gera muitas complicações.
[2] Recomendo também o filme “Z” de Costa Gavras.
[3] E aqui vale a pena recordar a cena tensa de Batalha de Argel, onde preparam uma bomba para colocar em locais públicos, gerando também um desconforto para quem vai colocar a bomba sabendo que irá ferir pessoas.
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