Várias vezes Lucien
Febvre usará a expressão “combates pela história”, mesmo que
esta frase seja pouco clara ela indica que o francês sabia muito bem
dos jogos de poder em que a História está inserida e faz parte –
independente de sua vontade. De alguma forma acredito que um dos
nossos desafios contemporâneos dentro da sociedade brasileira seriam
“combates pela cidade”. Moramos em cidades péssimas, e neste
quesito nada melhor do que a copa para ilustrar isto. Não podemos
fugir de nossa história, negar nosso passado é tão difícil quanto
fugir do saudosismo. Sobre este problema urbano que nossa realidade
concreta nos impõe, a teoria rizomática pode ajudar muito.
De maneira geral e
resumida, as cidades brasileiras não passaram pelo rígido esquema
de quadras de nossos vizinhos colonizados por espanhóis. Quando
observamos esta grade nas cidades coloniais, percebemos que a rigidez
é outra, Paraty não é tão geométrica como Colonia del
Sacramento, mesmo que nossa percepção indique que ambas seguem um
mesmo “plano diretor”. O que ocorre é que nossa geografia e
constituição também é outra.
O grande roteiro das
reformas urbanas no Brasil (muitas vezes ainda) seguem o estilo do
“bota abaixo”, ou da demolição do cabeça de porco, episódios
já bem documentos que ocorreram no Rio de Janeiro – então capital
do país[i].
O plano é simples, a constituição presente da cidade não atente
os desejos de modernidade da época, então destroem todo e refazem a
cidade, seguindo um plano de forte inspiração (e cópia) europeia.
Neste sentido os grandes alvos são os cortiços, e logo em seguida
as favelas.
Não há cidade no
Brasil que não possua uma favela ou algo que se assemelhe a isto. No
geral chamamos de favela lugares onde as habitações apresentam
inúmeros problemas habitacionais como: mobilidade, saneamento,
desmoronamento... Sabemos e não negamos que as favelas apresentam
problemas de urbanidade. Porém o interessante é observar que
durante anos o modelo seguido é um puro fascismo urbanistico, não
abrindo mão de tratores para demolir tudo que está ali e
reconstruir novamente algo o mais próximo possível de ideais
iluministas/cartesianos. Nisto ainda somos reféns das quadras.
O rizoma ajuda a
combater este fascismo urbanista, nos faz compreender de que não
precisamos destruir uma favela para torná-la aprazível. Nos ajuda a
entender que a favela é uma constituição diferente de urbanidade e
para lidar com ela não precisamos destruí-la, mas sim compreende-la
e aceita-la. E querendo ou não as cidades brasileiras se constituem
de forma muito mais semelhante (e rizomática) as favelas do que ao
rígido e geométrico plano de quadras. Esta é nossa realidade, não
por acaso foi aqui que o conceito de bricolage ganhou forma,
parece que esquecemos disto.
[i]
Para mais detalhes recomendo ver: CHALHOUB, Sidney. Cidade Febril:
cortiços e epidemias na Corte Imperial. São Paulo: companhia das
Letras, 1996.
Nenhum comentário:
Postar um comentário