sexta-feira, 25 de agosto de 2017

Formação do Brasil contemporâneo - Caio Prado Júnior


Caio Prado Júnior é daqueles clássicos que quando lemos, nos perguntamos como pôde passar tanto tempo sem o ter lido? Formação do Brasil contemporâneo, lançado 75 anos atrás, mais precisamente em 1942, continua tratando de um Brasil atual. Seu recorte focado no Brasil colonial e seu processo de colonização. A obra é famosa por apresentar os famosos ciclos econômicos. Por entender o período colonial enquanto momento de gênese do Brasil, compondo o período mais extenso da história do país com aproximadamente 300 anos, é neste período que podemos perceber elementos de continuidade desde longa data. Basicamente, o elemento que carregamos desde o período colonial é a extração de recursos primários para exportação as nações centrais. O modelo de empreendimento está rascunhado nas grandes propriedades e no emprego de mão de obra barata (escrava, semi-escrava ou quase isso), acompanhado de baixa mecanização (braçal), pouca mobilidade social (sociedade escravocrata), baixo dinamismo (monocultura), altos lucros e a inventividade (tecnologia) mais erma possível.
A partir destas características gerais, os ciclos se desenvolvem com suas peculiaridades. Podemos falar de três grandes ciclos: a cana-de-açúcar, o ouro e o café, que apesar de ter seu momento de glória apenas após a independência, mais precisamente na segunda metade do XIX, o assunto é ensaiado por Caio Prado Júnior, como também é um ciclo com seus primeiros passos no período colonial. Por se tratar de uma economia voltada para exportação aos mercados das economias centrais (Europa ocidental), este será um dos elementos que favoreceram o povoamento restrito ao litoral, mantendo os centros de produção o mais próximo possível dos portos e desconectados entre si. Este modelo latifundiário e monocultor tornava as condições de trabalho extremamente pesadas e desagradáveis, recorrendo a mão de obra escrava, tanto indígena quando africana. Os indígenas foram escravizados das formas mais distintas, e seu emprego entrou em declínio conforme o número deles diminuía – epidemias e serviço pesado associados a péssimas condições de trabalho favorecem o extermínio de populações. Como era utilizada mão de obra escrava, e por isso barata, a preocupação com o desenvolvimento de novas técnicas era nulo e até mesmo não incentivado, situação que piorou após a independência das 13 colônias, gerando o entendimento de que o desenvolvimento de manufaturas favoreciam a busca por independência.
Por serem latifúndios monocultores voltados para altas margens de lucro, as crises de escassez de alimentos eram constantes, dado que os fazendeiros não viam vantagem em ocupar terreno plantando alimentos como mandioca ou milho, quando a venda de açúcar ou a extração d'ouro se mostravam mais rentáveis, possibilitando maior lucro ao comprar esses alimentos em vez de plantar. A crise de alimentos era constante, em regiões como em Pernambuco, onde a geografia menos acidentada favorecia a extensão dos latifúndios. a situação era mais grave. Enquanto no Rio de janeiro mais acidentado, provendo pequenos espaços menos favoráveis ao latifúndio monocultor, as pequenas e médias propriedades se concentravam na produção de alimentos básicos como: milho, mandioca e feijão. A solução encontrada para produção de alimentos sem atrapalhar a monocultura foi a criação de gado. Criado solto após as regiões monocultoras, na hinterland, se alimentava do que era oferecido pela natureza sob a vigilância de alguns vaqueiros, tornando sua manutenção barata. Outra vantagem é que o gado se transporta até os centros de abate e consumo, também barateando seu transporte.
Assim sendo, temos retratado a pauta da economia brasileira a partir de sua gênese colonial, período mais extenso de nossa história, e por isso nos legando os traços de continuidade mais rígidos, apesar de rupturas significativas. Mesmo com todas as transformações ocorridas desde a independência ou 1942 (ano de publicação da obra), continua complicado sob uma análise mais abrangente do Brasil, não perceber a dependência econômica na extração de commodities para a venda no mercado externo. Bem verdade que, algum maior grau de manufatura se apresenta, assim como não há a dependência de um único setor como foi outrora em relação ao café, e as exportações, ainda que majoritariamente para os países centrais, também encontram espaço em outros mercados. Mas, nossa mão de obra continua barata, os latifúndios ainda predominam, o grau de manufatura é limitado o que não só agrega pouco valor ao produto, como dificulta a importante mobilidade social, as patentes ainda são poucas e algo do mais significativo, a maior parcela da população brasileira continua morando em até 100Km de distância do mar. Transformar esta estrutura colonial que carregamos talvez seja um dos maiores desafios.


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