quarta-feira, 18 de junho de 2014

O Oriente das Cruzadas - George Tate

     A Idade Média é um dos períodos mais interessantes e incompreendidos da história, parecendo fazer uma ponte entre o mundo antigo e o moderno, o período médio foi conturbado, plural e nem tão obscuro e atrasado quanto se supõe. Nada disto apaga atrocidades e confusões, a exemplo das Cruzadas, algo tão famoso e pouco recordado por nós, “ocidentais”.
     O livro de George Tate não se dirige exclusivamente a especialistas, pode ser facilmente lido por qualquer curioso, é um resumão de como ocorreram estas cruzadas. Seu ponto mais inovador é o enfoque num ponto de vista “oriental”, dando menor enfase ao ponto de vista cristão europeu. Problemas sérios das cruzadas são mostrados, como por exemplo o curioso fato de que os bizantinos – também cristãos – se viam mais próximos e semelhantes aos árabes, enxergando os francos como um povo bárbaro e incivilizado, e personalidades como Renaud de Chântillon acabam não fugindo da ilustração do cavaleiro sanguinário e com um certo grau de lunático, devido a suas empreitadas guerreiras desprovidas de qualquer senso estratégico. Para Renaud de Châtillon, e a bem da verdade para boa parte dos cruzados, o fato de carregarem o símbolo de Deus os impediria de perder, tal qual ocorrera com Constantino I.
     O mais fantástico do livro é sua abordagem que não coloca o “ocidente” num pedestal até porque dividir o mundo entre “ocidente” e “oriente” ainda parece ser algo complicado para a época. Boa parte das fontes e citações são de historiadores árabes da época ou judeus, isto sem abrir mão das fontes europeias sobre o assunto. Desta forma temos um trabalho mais sério e conciso do que se poderia esperar de uma obra voltada para não especialistas em história.
     Da mesma forma que mostra todo o lado nada glamouroso das cruzadas, o autor aborda de maneira séria o assunto, deixando o sensacionalismo histórico de lado, a ilustração dos cavaleiros cruzados como simples fanáticos religiosos que levaram sorte e conseguiram conquistar Jerusalém como pura sorte, se mostra incorreta. Devido a seu olhar para o outro lado do conflito, podemos perceber que brigas internas entre os árabes, terceiros e quartos elementos também a espreita de novos territórios, ajudaram e muito os cruzados nas suas conquistas. Muitas vezes vistos como problemas menos urgentes, o senso estratégico levava a decisão de uma tolerância maior com as movimentações na Palestina, isso contudo não pode levar ao entendimento de uma fraqueza ou entrega destes territórios para o cavaleiros de cristo. Ao mesmo tempo que os europeus tinham um exército significativamente menos numeroso e poderoso que o árabe, em especial pelo regresso de boa parte dos cristãos após a conquista da terra santa, eles possuíam a vantagem da armadura, tornando seu exército (principalmente a cavalaria), mais pesada e robusta que a árabe – por sua vez muito mais numerosa. Desta forma os generais árabes sabiam que a reconquista daqueles reinos latinos do oriente, não eram uma tarefa impossível, mas seria da mesma forma muito dura e era difícil precisar a força de seu golpe.
     Pela abordagem do filme Kingdom of Heaven de Ridley Scott, há uma influência clara do livro de Tate. Além de pensarmos a idade média e as cruzadas por meio desta obra, podemos também começar um diálogo sobre um tema caro para os historiadores, escrever obras que não sejam dirigidas para o público especializado, o que querendo ou não se mostra um desafio. Apesar disso fazer uso da crença comum de que historiadores não sabem escrever para não historiadores, se mostra um argumento pouco sólido, já que obras como O queijo e os vermes, História do Brasil para ocupados, as “Eras” de Hobsbawn, boa parte do trabalho de Boris Fausto e revistas como a RHBN, deixam clara essa possibilidade e existência.

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