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sábado, 15 de junho de 2013

News the Lord Told Us - Bira

 
Atualmente não podemos negar a importância da internet para isto que chamamos de liberdade, especialmente a pessoal. Os eventos que ocorreram na Tunísia, Egito, Israel, Turquia, São Paulo... soube de todos eles pela internet muito antes de passar na mídia convencional. Entretanto vejo que esquecemos muitas vezes que antes da internet já haviam alternativas para a mídia convencional e monopolizadora acima de tudo, dos quais podemos citar conglomerados como Globo, Abril, Televisa (México), Clárin (Argentina) e por ai vai. Defendem a liberdade de expressão até onde vão seus interesses, numa sociedade onde a informação se mostra cada vez mais estratégica, manipular (igual um químico manipula elementos) esta informação é algo de suma importância. O principal interesse de uma empresa é o lucro, e não vamos esquecer a mídia convencional é formada por empresas, que visam o lucro. Detalhes a parte podemos perceber que uma série de assuntos acabam não sofrendo abordagem, seja pelo desinteresse, medo ou falta de público para tal assunto.
   Neste ponto uma coisa que rolava muito antigamente era a troca de material. Emprestar discos, gravações em fitas k7 ou na casa de algum amigo para escutar música eram práticas normais e corriqueiras. Muitas vezes alguém mais abonado conseguia viajar para outro lugar, dentro ou fora do país, e de lá trazia algum som novo que estava longe de tocar nas rádios, ou a exemplo do chamado rock gaúcho, estava restrito a uma região. Não só isso, como há sempre a produção independente local, sem apoio de gravadoras ou alguma rádio – papel que a Rádio Atlântida, filiada a “toda poderosa” RBS, exerceu de alguma forma durante muito tempo nos estados de Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Verdade seja dita conheci muito material por meio desta mídia convencional, foi numa grande rádio que ouvi the Doors pela primeira vez e assisti Pulp Fiction na programação tardia de uma grande rede televisiva, mas foi graças a trocas com amigos e conversas que aprendi e conheci muito mais.
Também existem – sim ainda existem, a internet só está somando – esses outros meios. Como eu era um singelo garotinho durante os anos 1990, ficava complicado sair de casa. Ainda brincava e era esta atividade essencial que tinha com meus amigos durante minha pré-adolescência. Porém devo muito ao contato com as pessoas mais velhas ao meu redor, meu tio é que emprestou o cd do Lez Zeppelin para minha irmã gravar numa fita k7 e assim podermos acessar tão restrito material de maneira barata, que coubesse no restrito e inexistente orçamento – meu pai não dava mesada. Minha tia possuía a clássica coletânea do Smiths com as duas fotos do Mccullin (se não me engano). Porém agradeço muito a minha irmã, alguns anos mais velha do que eu, ela fazia algo que parece ser corriqueiro até esta época, pelo que sei meus pais faziam a mesma coisa. Era ela que ia para o centro encontrar seus amigos, sem combinar anteriormente nem nada, sabia dos lugares frequentados pela galera. Algumas vezes ela aproveitava para distribuir currículos, encontrava algum amigo e já logo aproveitavam para fazer alguma outra coisa, desde que fossem baratas, óbvio.
Numa destas investidas ao centro chegaram até minhas mãos duas edições deste zine que rolava por aqui na cidade de Blumenau: News the Lord Told Us. Foi por meio deste zine que muita coisa eu fiquei sabendo e encontrei textos que falavam de coisas que refletiam muitos sentimentos meus. Mesmo sem ter conhecido na época muito mais gente do que a minha irmã – da qual até hoje gosto de encontrar para “curtir um som” – foi ótimo saber que havia mais pessoas na cidade que se interessavam pelas mesmas coisas, afinal o zine era feito aqui. Conforme pude fui tomando contado com o que ali estava, e outras foram aparecendo ao longo do tempo, a maior parte, como sempre, acabei esquecendo mesmo. Guardei estes dois exemplares, distribuídos gratuitamente e que não passavam de uma A4 xerocada dos dois lados (uma saída barata), e recentemente devido a modificações aqui em casa, reencontrei estes exemplares e recordei muita coisa. E também acho que é pertinente a muitas outras coisas que vem rolando atualmente. É pertinente ao nosso tempo.
Faz algum tempo eu vinha querendo postar material restrito, em especial zines, no blogue, fugir às vezes da literatura que tu consegue fácil numa livraria, seja pegando direto na estante ou comprando nalguma loja online. Primeiro me faltava um escâner, que agora apareceu e estou usando ele bem feliz (minha vida social está um pouco mais restrita, verdade). Foi então que cheguei a conclusão que deveria inaugurar esta prática de postar alguns zines por um dos primeiros – ou o primeiro, pouco importa afinal – material restrito que chegou a minha mão. Espero que gostem do escaneamento do zine que disponibilizo para vocês. Está em jpg.


segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

Urubu - Douglas R. Grubel


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Certa vez li em algum lugar que o livro deve ser um objeto de transformação. O livro deve conversar com você, deve servir para você como um óculos, você usa para mudar sua visão sobre algo. Ou evitando o caráter de correção que o óculos pode ter, a leitura pode trazer efeitos semelhantes a consumir alguma droga, ele pode mudar sua forma de ver e perceber as coisas. Não devemos ter medo do livro, nem da mudança. Constantemente estamos trilhando algum caminho, às vezes mais rápido outras vezes mais devagar. Muitas vezes a leitura pode te ajudar, mas nem sempre.
O que é muito bom observar é que de alguma forma o livro aqui não ganha nenhum bastião especial. Ele foi encontrado no lixo, desprezado como tantas outras coisas. Mas é a partir deste acontecimento que outros se tornam possíveis. E para isto talvez não houvesse maneira melhor de dizer isso do que da forma que foi dito, no caso publicando esta história de forma independente, quase anônima e a um custo baixo. Além do mais a forma com que irá circular, literalmente passando de mão em mão, talvez seja uma das mais bonitas atualmente.
Pode parecer clichê falar sobre isso, mas cada vez mais parece importante não tratar as pessoas como burras. Acreditar no seu conhecimento e capacidade de raciocínio, reconhecer isso no homem popular, algo que parece muito bem ignorado pela tradicional classe-média brasileira. O grande personagem da história é um sujeito solitário, que vive num lixão, que pinça as coisas feito um urubu que pinça a carniça. A metáfora do urubu é mais do que uma simples referência ao lixão, o personagem faz feito esta ave: pinça o que lhe interessa e escolhe o que irá ingerir. Por mais que existam limitações, ele estará escolhendo o que ingerir. Gosto da metáfora das tatuagens, onde diferente do ferro quente que marca o gado, você está escolhendo quais serão suas marcas no corpo. Em alguma medida o livro possibilita isto, especialmente a literatura, ou o livro que lemos deitado na cama, já que este não possui obrigatoriedade alguma.
Não só é uma história como é também uma profanação, e este ato é cada vez mais necessário hoje em dia, até porque parece que apenas as crianças ainda conseguem faze-lo de forma autêntica. É brincando (Spielen, Play, Jour) que se pode construir coisas novas. E profanando, tirando as coisas de seu lugar e função no caso, que se possibilita novas visões. Profanar o livro talvez ajude a relacionar-se com ele. E a relação se mostra como uma das coisas mais importantes para o ser humano, já que o livro pouco importa se eu não me relaciono com ele, e esta relação acaba demonstrando muito mais do que simples entretenimento capitalista, onde parece haver uma simples busca por prazeres secretos e passiveis de consumo.

terça-feira, 30 de outubro de 2012

TAZ, Zona Autônoma Temporária - Hakim Bey

          As coisas acabam. O grande trauma de muitas questões do nosso cotidiano é o fato de não entendermos que nada é eterno. Dai nossa decepção quando algo, onde tanto apostamos acabou não vingando. Da mesma maneira comumente esperamos que tudo melhore, quando talvez fosse mais saudável compreender que as coisas mudam, ganham outra forma, e tiveram a intensidade possível em seu momento.

          Neste sentido olhamos para os movimentos atuais com muita dúvida. Sua indefinição nos confunde, mas ao mesmo tempo diz muito mais do que queremos ouvir. Triste é o coro quase geral por um pedido de regresso ao estado de bem-estar social, que parece ser o grande mote dos protestos nos países em crise dentro da União Europeia. Concordo que é menos assustador que o burburinho de alguns europeus pelo regresso de regimes totalitários (em especial: Espanha, Portugal e Grécia, países com largo histórico de ditaduras). De qualquer forma em ambos podemos observar uma saudade do passado, algo sempre muito perigoso, ou desejo por uma estagnação (no caso chegar em algum ponto e ali ficar eternamente) que por sinal é pautada em tempos passados – seja o bem estar social europeu ou as ditaduras. Esta volta ao passado revela, dentre tantas coisas, este desejo por estagnação, pelo eterno, é uma lamentação pelo fato de algo terminar.

          Esta dificuldade por compreender que as coisas acabam se mostra mais perene no caso da chamada primavera árabe. Ao derrubarem os regimes ditatoriais (que durante anos não foram chamados assim pela mídia internacional) fora dito que uma avalanche por democracia varia estes povos. Pretensão tamanha a “desses ocidentais” que além de durante anos terem sustentado e apoiado estes regimes autoritários, agora dizem, antes mesmo de perguntar, que o desejo desses povos é por um regime igual ao nosso – e fica a pergunta, o que é afinal democracia? Não queremos aceitar que deste emaranhado chamado terceiro mundo possa vir a evidência mais autêntica dos últimos tempos, desprezo e descrença por fundamentos largamente construídos nos últimos 300 ou sei lá quantos anos. E há uma dificuldade em compreender isto, principalmente por não aceitarmos a possibilidade do fim.

          Talvez deixar de desejar tanto o eterno seja a melhor atitude, mas como apagar marcas inscritas de forma tão profunda em nossa pele? Talvez este seja o grande desafio atual. Também sabemos que não há como apagar estas marcas sem deixar outras, e concordo que pouco sabemos (ou aceitamos) que marcas poderiam ser estas. Nosso corpo é marcado, traumatizado, e muitas vezes acabamos criando alguma afeição pela cicatriz.