sexta-feira, 8 de junho de 2012

Por amor às cidades - Jacques LeGoff

     Alguns cálculos trazem de que no mundo antigo era necessário aproximadamente 10 pessoas trabalhando no campo para que uma pudesse viver na cidade. Morar na cidade era um privilégio, poucos podiam, não por acaso as cidades medievais eram pequenas. Além disso haviam os perigos recorrentes das pestes, guerras e turbas revoltosas e famintas. Os muros que serviam para proteger também matavam, seja de fome caso algum cerco durasse muito tempo, ou seja pela má circulação de ar, que somada aos esgotos a céu aberto, colaboravam para a proliferação de doenças.
     Entretanto temos uma tendência positivista em olhar para o passado sempre com certo desprezo. Como colocou Nietzsche certa vez, até podemos desejar voltar ao momento em que se era mais jovem, mas dificilmente desejaríamos voltar a mentalidade que tínhamos outrora. Pensando nesse passado acabamos ficando sedentos pelo futuro. De forma geral a herança positivista está inscrita em nossa pele, especialmente quando possuímos algum nível de escolaridade. O que se passa por fim é que, durante longo tempo olhava para a Idade média com desprezo, seja por ver este período como um momento de trevas, seja pelo desprezo a histórias de cavaleiros, cortes, príncipes, princesas e nobreza. O problema é que até então eu sempre tão admirador do romantismo, ignorava o povão da Idade média. Desconhecia os resquícios e conclusões referentes ao seu pensamento e comportamento.
     Jacques LeGoff parte da ideia de que a cidade medieval teria mais semelhanças com a cidade moderna, do que a cidade antiga. Partindo dai, ele se propõem a analisar e explicar uma série de questões sobre as cidades medievais e as modernas, tudo claro, de forma geral, o que é perfeito para curiosos que não desejam se especializar, ou simplesmente alguém que busca algum ponto de partida.
     Acredito, e posso cair num saudosismo barato, que a Idade Média fora um dos momentos mais vivos do ocidente (leia-se Europa). As pessoas gozavam de uma liberdade maior que a nossa, sua vida estava menos regularizada pelo Estado. Não por acaso o fortalecimento dos Estados vai marcar o fim da Idade Média. O que acaba desmotivando um pouco é saber que tais regularizações acabavam ocorrendo de outra maneira: se o ritmo de trabalho não era determinado pelo relógio, era ele determinado por obrigações com o senhor feudal, ou se não havia toda uma regularização da vida por meio do Estado, a Igreja marcava sua presença. De qualquer forma, períodos diferentes exigem instrumentos distintos para interpretação.
     Entretanto a relação dos medievais com a cidade era algo mais vivo do que hoje. A cidade era muitas vezes um lugar de fuga, não era necessariamente reservada aos mais ricos, mas tão pouco suportava todos. Algo estranho para nós tão desejosos por um direito a cidade. O que se passa é que a cidade medieval possuía populações numericamente inferiores as atuais, entretanto sua população se revelava muito mais ativa e criativa do que as populações atuais. O que me interessa nas cidades é viver elas, mas não viver como me parece sugerir o repórter local¹, mas um viver de conhecer as frestas, cafés, bares, praças, de andar a pé, bicicleta, ver as pessoas, flanar. E creio que olhar para estas cidades medievais, possam ajudar a nós “pós-pós-modernos” a nos relacionarmos e transformarmos nossas cidades. Até porque já demonstramos um cansaço por esta cidade das rodovias, ausente de calçadas e cinza (fuligem), entretanto não queremos abrir mão das possibilidades citadinas.
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¹ No caso o apresentador Alexandre José tem como um de seus slogans: “a voz de quem vive a cidade”. Vale ressaltar que o jornal por ele apresentado não exita em cair no sensacionalismo geral da televisão, noticiando em grande medida acidentes, assaltos. Um de seus jargões é “bota o vagabundo na tela”.

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